Palavras no ar

Estação Jabaquara. O metrô não estava muito cheio, com tranquilidade eu havia conseguido um lugar para sentar e ler sossegado. A porta fechou e, logo em seguida, abriu após uma voz de mulher pedir para não segurarem as portas do trem. Um grupo de cinco pessoas, todas jovens, entrou eufórico, eu poderia até dizer que estavam aos gritos umas com as outras; três rapazes e duas moças, e foram para o fundo do vagão. A discussão calorosa continuava e eu lia nos seus gestos uma grande euforia em uma conversa que eu não conseguia entender. Fiquei interessado, eram jovens que discutiam, riam e se abraçavam. Eram jovens, e contagiavam. Via-se que elevavam o tom, falavam rápido e firme com todos os pontos e vírgulas que eu conseguia captar. Atropelavam-se na conversa, falavam ao mesmo tempo, passavam à frente do outro, punham ponto final fazendo valer a sua posição, o diálogo re- tomava calmo e eu hipnotizado ia seguindo cada gesto, cada sinal, tentando decifrar o significado daqueles códigos.

Estação São Judas. Estava tão envolvido, tão absorvido que não vi a Conceição passar, não ouvi a voz de mulher anunciar “próxima estação” e “next station”, esqueci o livro que estava lendo e com ele os meus gritos internos, minha letargia, meus murmúrios sussurrados... A minha angústia não era mais a “Angústia” de Graciliano Ramos. Agora eu queria entender, decodificar tudo com um olhar mais aguçado, vivo, era uma angústia curiosa, boa, invejosa daqueles que escreviam no vento uma linguagem que eu não entendia.

(...)

Este texto faz parte do livro Revelar-se Autor 2019


Educador(a)
Braz Gomes da Silva Filho
SME - COPED


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